DAROÊS

Um simples mortal não pode aferir a retidão de um daroês. Um dervixe é alguém que calcinou, em labaredas, a feição da identidade e cumpre, socialmente, formalidades do mundo, sem escravizar-se.
Sua escolha não tem a ver com escolha.
Seu martírio é a moralidade do mundo, tão profundamente imoral. Seu calvário é caminhar entre iguais, lendo-lhes as aberrações da alma, sem perder a sanidade. Sua dor é a dor do ser, em si realizado, ainda quando poucos possam ver a luz dos seus olhos.
Desfruta todas as coisas, e as coisas aspiram por desfrutá-lo, já que a elas renuncia e, renunciando, as possui.
As pedras o reverenciam. O mar aquieta as ondas, na praia. Estrelas se ocultam sob o manto da noite.
O chão se antecipa, solene, aos seus passos. O júbilo percorre a relva. Guirlandas povoam as copas.
Sua simples aproximação harmoniza bons e maus, extingue, pelo breve momento da sua passagem, toda ideia de separação.
Mas as criaturas não ajuízam sua presença, porque seu corpo assume o anonimato. Assim ele passa ensinando, sem ensinar, de fato. E segue para além do entendimento, antes que o mesmo resvale a estreiteza, dizendo aos homens que, depois deste advento, outra será a sua humanidade.

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