Lençol humano, de Yohan Barcz

“Lençol humano” é o primeiro livro de Yohan Barcz, que já escreveu bastante coisa aqui no site Delfos (delfos.net.br) e hoje em dia é meu colega de podcast no Ludologia e toca o Antropogamer.

“Lençol humano” é uma coleção de contos bem interessante. São contos bem curtos, alguns com apenas um parágrafo e os maiores com três ou quatro páginas, formando um pequeno livro que não chega às 60 páginas. Assim, é uma boa obra para ler aos pouquinhos, um ou dois contos por vez, mas também é apropriada para ser devorada em uma tacada só, como eu o fiz.

Contos são uma forma diferente de contar histórias. Como cada novo capítulo é uma nova história totalmente independente, não há uma linha narrativa abrangendo todo o livro. Há, por outro lado, uma linha temática. Desgosto, desilusão, violência. É curioso que meu caminho esteja entrelaçado com o do Yohan, no Delfos e no Ludologia, além de termos publicado nossos primeiros livros no mesmo ano (ele até fez o prefácio para “Pimpa e o Homem do sono”), mas nossas obras não poderiam ser mais diferentes.

“Lençol humano” é de difícil digestão, mas é melhor por isso. O conto título, que abre o livro, elabora a falta de motivação para sair da cama (quem nunca?), em uma história desiludida, mas apenas isso. A violência logo começa a fazer parte das histórias.

Em “Independência ou morte”, conhecemos a história de uma mulher vítima de violência matrimonial. A escolha de palavras de Yohan Barcz é seu maior trunfo, com referências ao hino nacional que desvirtuam totalmente o sentimento patriota da canção. “Lençol humano” é mais vocabulário do que narrativa, e por Odin, como este meu colega é bom em escolher palavras.

Trevisan coloca um pouco de fantasia nas histórias, elaborando a violenta caça a um vampiro. Com “Bestiarium”, a coisa muda um pouco. Uma história que começa sob o ponto de vista da vítima em uma escola se transforma quando esta se torna o agressor. É o ponto de virada para o lado mais sombrio do livro, em que as histórias passam a ser contadas não pela vítima da violência, mas por seus perpetradores.

“El cuervo”, a história final, por exemplo, é contada do ponto de vista de um casal que rouba tatuagens valiosas. “Desejo supremo”, por outro lado, começa banal, com um marido que queria ver a mulher sendo carcada por outro cara, mas termina em um múltiplo assassinato. Sem exagero, “Lençol humano” começa deprê, mas vai ficando cada vez mais psicopata.

Isso não significa que não haja histórias com assuntos mais mundanos. Em “Conversa de bar”, Yohan explora uma linguagem mais coloquial, em um texto com pontuação limitada que reflete como as pessoas falam umas com as outras. “Apenas outra história de domingo” volta à temática da vítima da violência, narrando um assalto extremamente agressivo de forma mundana e desiludida, bem típica do resto do livro.

Eu gostei bastante de “Lençol humano”. É sempre complicado resenhar algo de um colega, então decidi de antemão que não daria notas. Porém, admirar o poder que Yohan Barcz exerce com as palavras foi um prazer, bem como fazer esta viagem por sua mente desiludida. É um livro curto e pesado, como um prazeroso soco no queixo.


Fonte: https://delfos.net.br/

Carlos Eduardo Corrales, formado em jornalismo pela PUC-SP e publicidade pela ESPM, é editor-chefe e fundador do site Delfos em 2004, habita mais frequentemente as seções de cinema, games e música. Trabalha com a palavra escrita e com fotografia. É autor dos livros infantis “Pimpa e o Homem do sono” e “O shorts que queria ser chapéu”, ambos disponíveis nas livrarias. Já teve seus artigos publicados em veículos como o Kotaku Brasil e a Mundo Estranho Games.

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