Jorge Fernando dos Santos lança ‘Condomínio Solidão’

Romance é ambientado no Conjunto Kubitschek, mais conhecido como Edifício JK, onde o escritor e jornalista residiu por um período de mudanças em sua vida

 
 

O jornalista e escritor Jorge Fernando dos Santos, 64, morou no  Edifício JK entre os anos de 2011 e 2012. “Na verdade, morei nos dois blocos e achei uma experiência interessante. Eu nunca tinha morado num apartamento. De repente, estava ali, num conjunto habitacional enorme e cercado por vizinhos de todos os tipos”, diz ele, lembrando que são mais de mil apartamentos nos dois blocos, que somam quase 60 andares. Calcula-se que número de moradores gire em torno de 6 mil. “Ou seja, o JK tem mais gente que muitas cidades por aí. Gente de várias idades e profissões, inclusive muitos aposentados”, situa. 

À época, Jorge estava morando sozinho pela primeira vez, depois de se separar. Foi então que resolveu escrever um livro falando dessa nova experiência. Nascia, assim, “Condomínio Solidão” (Caravana Grupo Editorial, R$ 49,90), obra de ficção que chega agora às livrarias, mas que, na verdade, começou a ser delineada há oito anos. “Foi, inclusive, finalista do Concurso Nacional de Literatura Cidade de Belo Horizonte de 2012, mas, de lá para cá, eu mexi bastante nos originais. São mais de 20 personagens, e a obra é toda ficcional, num clima de muito suspense”, revela.

 
 
Jorge narra que engendrou uma narrativa fragmentada em vários depoimentos. O protagonista, Ramon Fernandez, reside no 30º andar da torre de vidro do JK  e resolve escrever um romance ambientado no prédio.  “Ramon trabalhava em um jornal, mas perdeu o cargo por desobedecer o chefe de redação, que tentou censurar uma reportagem sobre corrupção policial envolvendo um delegado amigo da casa. Depois do divórcio e da aposentadoria, ele parte para refazer a vida. Livre das antigas obrigações, decide que é hora de se dedicar à literatura, um velho sonho jamais realizado”, compartilha. 

Nesta empreitada, o personagem decide entrevistar alguns vizinhos e funcionários do condomínio, em busca de verossimilhança. “Os capítulos de ‘Condomínio Solidão’ são pedaços dos depoimentos hipoteticamente gravados por ele. Suas falas acontecem nas sessões de terapia, que faz já há algum tempo”, prossegue o autor. Embora seja ficcional, Jorge reconhece que Ramon vive, no livro, muito daquilo que ele próprio estava vivendo enquanto escrevia. “Os capítulos são como as janelas atrás das quais se revelam histórias das mais variadas. E enquanto ele entrevista seus vizinhos, acaba desvendando o mistério em torno do suicídio de um jovem estudante morador do seu prédio”, cita, revelando o veio do suspense, que conduz a narrativa. Avançar deste, claro, seria tirar o prazer do leitor.

Mudança de CEP. Jorge Fernando explica que, depois que se mudou do JK para a Savassi, continuou lapidando o texto, entre um e outro novo projeto literário. “Na verdade, escrevi tudo sem fazer pesquisas. Ao contrário do protagonista, eu não entrevistei ninguém. Apenas imaginei os dramas que poderiam se ocultar atrás daquelas paredes e janelas. Por isso mesmo são personagens muito diversificados, cada qual com seus traumas e experiências, maneiras de falar e de ver a vida”. 

Neste caldeirão, temos um ascensorista, um porteiro, uma idosa que nunca esqueceu o marido que a trocou pela empregada, uma arrumadeira que dá notícia da vida de todo mundo, um soldado, um travesti, um policial civil aposentado, um roqueiro, um ex-morador de rua e um ex-preso político, entre outros. Além, claro, do protagonista Ramon, naturalmente. “As narrativas são todas em primeira pessoa e acabam formando uma espécie de mosaico”, conclui.

Em tempo: a capa de “Condomínio Solidão”, inspirada na fachada do JK, traz os traços de  Élen Márcia. “Todo mundo tem elogiado. Ela também ilustrou o meu ‘Cordel Camará – A história e as lendas da capoeira’, que sai brevemente pela Paulus Editora”, diz o escritor.

Três perguntas para Jorge Fernando dos Santos

Qual a sua relação com o gênero suspense, trabalhado neste seu novo título? Quais os autores que admira (ou livros em particular)? Como leitor, eu gosto de quase todos os gêneros literários. Deve ser por isso que escrevo livros em vários gêneros, com diferentes temáticas, incluindo romance, conto, novela infantojuvenil, cordel, haicai, biografia, memória etc. A literatura policial no estilo noir é uma das que eu mais gosto. Sobretudo autores como Dashiell Hammett, Ross Mcdonald, Laurence Block, Léo Malet, Ricardo Piglia e o nosso saudoso Rubem Fonseca. Mas a minha formação inclui influências de Hemingway, Bukowski, Camus, Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, Murilo Rubião e muitos outros.

Fale sobre a sua impressão hoje, do Condomínio JK, o que esse edifício tão icônico representa arquitetonicamente para a cidade, na sua opinião. O JK quebrou o paradigma do positivismo que inspirou a construção de Belo Horizonte, com as classes profissionais separadas, cada qual no seu bairro. Niemeyer, com a sua visão socialista, tentou criar um conjunto habitacional que aproximasse pessoas de diferente classes e profissões. O mesmo ele fez, por exemplo, no Edifício Copan, em São Paulo. O JK andou muito degradado durante certo tempo, mas hoje está bem melhor. Quando morei lá, o ambiente era muito bom e eu me sentia totalmente seguro. A vizinhança era variada e muito discreta. Atualmente, as fachadas estão sendo renovadas com a instalação de janelas de alumínio e isso está melhorando o visual dos dois edifícios. Morar lá entrou definitivamente para a minha biografia. Eu nunca tinha imaginado isso. Já pensou, morar num cartão postal, um marco da modernidade projetado pelo Niemeyer, o maior arquiteto do país? Foi uma experiência muito rica, sobretudo para um escritor. Sem falar na paisagem que eu via lá de cima. Esse livro foi uma forma de homenagear o condomínio e de registrar as minhas sensações naquele momento.

Pergunta infalível nestes tempos. Como está sendo este período de quarentena para você? No início da pandemia, achei que seria difícil. Mas eu sou muito disciplinado e consegui ficar em casa e criar uma nova rotina de vida. Geralmente, eu saio apenas pra ir ao supermercado e aproveito pra andar um pouco, mas com os devidos cuidados. Só retomei o pilates recentemente. Eu leio e escrevo muito, faço artigos semanais para o site domtotal.com, estudo inglês, cozinho, me exercito um pouco e assisto Netflix quase todas as noites. Também este ano concluí um livro no qual vinha trabalhando desde o ano passado, sobre as músicas que falam de BH. Entrevistei mais de 50 compositores e enumerei quase 200 músicas relacionadas à cidade desde a sua inauguração, em 1897. Escrevi um conto inspirado na pandemia e acabo de finalizar o “Cordel da MPB – De como a canção brasileira nasceu, cresceu e conquistou todo o mundo”. Recentemente, Zebeto Corrêa lançou o CD “Nonada”, um disco de moda de viola com todas as letras de minha autoria. Pra fechar o ano, lancei este livro com o experiente editor Leonardo Costaneto, que fez um trabalho de edição muito profissional;  e estou de mudança para um novo apartamento, cheio de planos para 2021.

Fonte: https://www.otempo.com.br/diversao/jorge-fernando-dos-santos-lanca-condominio-solidao-1.2422543

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