Poemas – Edição bilíngue

Poeta antes de romancista Quando Art Tatum sentou-se ao piano, o apresentador anunciou: “Senhores, muitos tocam piano, mas Deus está aqui esta noite”. Anos mais tarde, Ítalo Calvino, em seu livro “Por que ler os Clássicos”, abriria seu texto sobre Hemingway dizendo que para ele e para tantos da sua geração, Hemingway era um Deus. O que mais dizer deste ganhador do Prêmio Nobel em 1954? Seria chover no molhado. O escritor Hemingway é um dos deuses do panteão da literatura mundial. É do poeta Hemingway que nos interessa falar aqui, do poeta antes de se tornar romancista, do poeta que, em 1923, pouco depois do fim da Primeira Guerra, descortinou o horizonte da poesia moderna. Com sua sintaxe quase coloquial, seus versos secos, crus e amargos, desprovidos dos ornamentos da poesia romântica e do lirismo burguês, Hemingway arrancava dos episódios de destruição, desolação e morte sentimentos virais e verazes. Não é de todo falso antever nos seus poemas o romancista que irá aflorar logo após a publicação de “Três Contos e Dez Poemas”, dos quais apenas os poemas constam nesta antologia, recheada de versos esparsos publicados em jornais e revistas. As frases curtas, as estrofes fotográficas, as cenas que se sucedem sem a preocupação formal ou a construção estética da poesia de então, as palavras repletas da mais pura e cristalina verdade, revelam o jornalista atento aos detalhes, ao movimento dos barcos nas enseadas, às marchas das tropas de combate, às armadilhas e rapapés do poder político e às igrejinhas literárias que ele acidamente criticava. Não poderiam faltar também alguns versos dedicados à Espanha e às touradas que ele via como um balé entre gladiadores no circo magistral da vida e da morte. Anthony Burgess escreveu: “Hemingway não sabia lidar com a tensão que a maioria dos homens enfrenta com elegância; acreditava ser parecido demais com os deuses para ser obrigado a fazer concessões”. Estes poemas revelam a sensibilidade do olhar de um homem perplexo e revoltado, melancólico e cansado do mundo, mas que é, ainda assim, capaz de festejar e amar a vida. Tonico Mercador

Sobre o tradutor Tonico Mercador é maranhense de nascimento e mineiro por adoção. Durante parte dos anos de 1970, viveu na Europa, transitando entre Londres, Paris, Estocolmo e Amsterdã. Sempre dedicado à literatura, publicou 7 livros de poemas e, em 2019, publicou o primeiro livro em prosa, O Invasor de livros, pela Caravana e, em 2020, foi homenageado por nós com a edição de 50 anos de poesia. Aos 75 anos, Mercador está em plena atividade profissional e intelectual. “Não sei fazer muitas coisas, mas certamente escrever é minha principal atividade e dela faço a minha vida. Com a escrita, eu construo mundos, sonhos, delírios, pesadelos e minhas memórias”, comenta o Tonico Mercador.